A propósito do nemátodo do pinheiro na Serra do Buçaco
Quando em 11 de Fevereiro de 2009 publicámos a informação de que a doença do nemátodo do pinheiro estava a contaminar árvores no perímetro florestal do Buçaco, Rui Rosmaninho, técnico da Direcção Regional de Florestas do Centro, acusou-nos de ligeireza. Na semana seguinte publicámos reacções de proprietários e de técnicos florestais, entre outros, que desmentiam categoricamente as declarações proferidas pelo técnico florestal do departamento do Estado responsável pelas florestas. E Rui Rosmaninho continuou a negar.
Seis meses depois, agora, em Agosto, a Associação de Defesa do Luso-Buçaco (ADeLB) e a Quercus denunciam a propagação da doença numa extensão de mais de quinhentos hectares e motivam um comunicado do Ministério da Agricultura reconhecendo a existência da doença. Diz hoje o Ministério da Agricultura – que, naturalmente, tutela a Direcção Regional de Florestas do Centro – que está planeada uma intervenção para abate dos pinheiros doentes… Mas só para Outubro, porque estão proibidas por lei as intervenções durante o período de voo dos insectos que transportam o nemátodo, o que acontece durante o Verão.
Afinal a informação dada pelo Jornal da Mealhada e o alerta feito não padeciam de ligeireza. A ligeireza estava do lado de quem ignorou o problema. Como disse Rodolfo Santos, proprietário de um pinhal na área da Serra do Buçaco abrangida pelo município de Mortágua, há seis meses: “Ligeireza é querer tapar o sol com a peneira e mandar areia para os nossos olhos”.
A doença propagou-se, atinge hoje uma área equivalente a quinhentos estádios de futebol, e só daqui a três meses se poderá dar um primeiro passo na resolução daquele problema.
Costuma dizer-se que faz parte das regras de boa educação não dizer “Eu bem te disse”, quando o mal está feito e os nossos avisos não foram tidos em conta. Mas agora apetece dizê-lo. O alerta foi dado parece-nos ter havido a intenção de ocultar a existência de uma situação que o próprio Estado classifica de calamidade para a floresta portuguesa.
E apetece dizê-lo porque, mais uma vez, se comprova que o Estado toma atitudes e tem comportamentos que reprime nos cidadãos e isso não está certo. No perímetro florestal do Buçaco, cerca de 974 hectares, é propriedade do Estado. O Estado que, por exemplo, obriga os cidadãos a abater os pinheiros ardidos e que nas suas propriedades não o faz – lembremos a este propósito as trezentas mil toneladas de pinheiros ardidos em Julho de 2005, no Vale da Formiga, e que estiveram muitos meses a apodrecer, de pé, com risco para todos e com grande prejuízo económico. O Estado entra pelos terrenos dentro e põe os seus técnicos a marcar todos os pinheiros com sintomas da doença do nemátodo dando dez dias aos proprietários para abater as árvores sob pena de sanção pecuniária, mas não abate os seus pinheiros doentes.
A Serra do Buçaco e especialmente a área onde se encontra o perímetro florestal do Buçaco é, nada mais, nada menos, a maior e melhor área de pinheiro da Europa. Dali sai uma madeira que é elogiada e cara. Uma área que agora está a apodrecer a olhos vistos por incúria do Estado.
Será que, se estes pinheiros infectados estivessem em terrenos de particulares, o Estado teria esta ligeireza de negar o óbvio e adiar a resolução do problema, tornando-o maior? Nós achamos que não. Felizmente que, para o combate à doença, a maioria dos pinhais não são propriedade do Estado. Infelizmente, porém, para nós, porque, embora vivamos numa sociedade democrática, o Estado, nas suas relações connosco, individual ou colectivamente, não tem a mesma conduta que nos exige.
O tempo mostrou quem é que agiu com ligeireza em Fevereiro, quando não era ainda Verão, nem época de voo dos insectos transmissores, e os pinheiros infectados eram só alguns. O tempo revela as verdades e as mentiras, por muito que nos custe.