Da urbanidade

A deposição e tratamento dos resíduos sólidos domésticos são problemas sérios das sociedades contemporâneas. As famílias hodiernas produzem quantidades enormes de lixo. Resíduos – em grande parte orgânicos – de que as famílias se querem ver livre, rapidamente. Para isso, tantas e tantas vezes, perante um caixote de lixo cheio – e muitas vezes cheio de caixas de papelão não espalmadas e de outros resíduos que deviam estar noutros locais – chegam a deixar os sacos com restos de comida na via pública, ou a arremessar os referidos sacos com esse material para terrenos baldios.


É fácil atribuir à Câmara Municipal a responsabilidade de, aos domingos à noite, nas ruas da cidade da Mealhada, os espaços que circundam os contentores de lixo doméstico serem autênticas lixeiras a céu aberto. Perante tal evidência, qualquer um seria capaz de decretar que o número de contentores é insuficiente. Então, o problema resolver-se-ia com mais contentores? Não cremos. Poderia também dizer-se que o problema é a falta de recolha de lixo doméstico ao domingo. Mas o problema vai muito para além disso.
Nalgumas regiões da Europa, em França por exemplo, não se vêem caixotes de lixo doméstico nas ruas. Prática que nos parece de aplaudir – os contentores de lixo doméstico são feios e custam dinheiro. Os moradores têm – em casa ou no prédio – um contentor, onde depositam o lixo doméstico, que só é colocado na rua a uma determinada hora – geralmente à noite – e posteriormente retirado, depois da passagem dos camiões de recolha, à hora marcada. Os contentores estão identificados e quem não os retirar é multado. As ruas mantêm-se limpas e, de certa forma, fica salvaguardada a saúde pública.
Se os franceses são capazes de ter o lixo em casa durante um dia inteiro, não são capazes os mealhadenses? O problema é de falta de educação cívica e, acima de tudo, de falta de urbanidade – característica de quem sabe viver em sociedade e em comunidades populacionais de tamanho significativo. E se ensinar os adultos a reciclar foi uma conquista, que surgiu como uma moda, e resultou de uma forte pressão na escola dos filhos, ensinar as famílias a gerir melhor os lixos domésticos vai ter de seguir o mesmo método. E rapidamente.
A rua, o espaço público, não é espaço de ninguém. É espaço de todos, é comum. Também não é espaço da Câmara ou da Junta de Freguesia. É espaço de todos, porque todos o utilizamos e (ainda) não pagamos impostos para isso. Não podemos todos ser prejudicados, na nossa saúde pública, com a falta de urbanidade de alguns (poucos, mas salientes).
Assim, se a situação não se resolver com a educação, resolve-se com a repressão e não se vê outra alternativa senão as entidades autárquicas aprovarem um regulamento através do qual sejam punidas, com multas e contra-ordenações, as pessoas que depositam lixo doméstico no chão, mesmo que ao lado dos caixotes de lixo, as pessoas que não depositarem o lixo doméstico devidamente ensacado, as empresas e estabelecimentos que não colocarem os caixotes de papelão, espalmados, no eco-pontos respectivos, entre outras. É de elementar urbanidade!

Editorial do Jornal da Mealhada de 13 de Outubro de 2010