Não tenciono perder muito tempo com o regresso do antigo primeiro-ministro José Sócrates.
Não merece. No entanto, como português, há algumas coisas que me incomodam realmente.

1. Não tenho dúvidas nenhumas que a ideia de José Sócrates (JS) passar a ser comentador da RTP1 é de Miguel Relvas, ou pelo menos teve o seu agreement. Se o director de informação da RTP o tivesse feito sem o beneplácito da tutela, Alberto da Ponte tinha-o demitido. Por muito menos demitiu Nuno Santos;

2. JS é de tal modo vaidoso que não foi capaz de resistir ao convite;

3. Os comentadores portugueses são na sua maioria parte interessada no debate. Ou seja, não são imparciais, procuram doutrinar, procuram defender os seus próprios interesses. Se isso pode ser discutível em Marcelo Rebelo de Sousa (que sendo um político frustrado afirma-se como reformado) ou em Luís Marques Mendes (que está aparentemente reformado), em JS é escandalosamente notório. Eu pergunto: Será que a RTP vai passar a dar tempo de antena a todos os políticos que sentem necessidade de se explicar e de ajustar contas – Otelo Saraiva de Carvalho? Pedro Santana Lopes?.

4. Deve a RTP usar recursos financeiros para branquear JS? Mesmo que o homem nem sequer queira cachet (o que já por si diz dos objectivos de JS).

5. A ala socratista do PS está, desde o inicio, empenhada em branquear a herança de JS. Essa tem sido a principal demanda de um conjunto de dirigentes – Pedro Silva Pereira, António Costa, Carlos Zorrinho, entre outros – que não pensa noutra coisa senão nisso, fazendo a vida negra a António José Seguro, que procura apresentar um novo paradigma;

6. Frustrado o putsh que António Costa iria empreender, reconquistando a liderança dos socialistas e, assim, poder defender o socratismo, o próprio JS toma em mãos a demanda, a poucas semanas de um congresso do PS, onde estará omnipresente, inquinando o debate e comentando no mesmo fórum que o levou à liderança do PS em 2004;

7. O principal prejudicado com o regresso de JS é António José Seguro, que terá meio PS a branquear o passado e outra metade a tentar esquecê-lo e apresentar um novo paradigma. Esta divisão vai tornar o PS ingovernável e isso vai ser bom para o PSD (mas péssimo para o país);

8. Com um cenário de completa loucura no PS, Passos Coelho pondera a hipótese de, caso o Tribunal Constitucional chumbe as medidas do Orçamento de Estado, pedir a demissão e provocar eleições antecipadas, convencido de que vai conseguir reforçar a maioria;

9. Por outro lado, o regresso do fantasma de Sócrates vai inviabilizar, completamente, a constituição de um governo de salvação nacional – com os partidos do memorando (PS, PSD e CDS) -, que foi enunciado pelo guru Angelo Correia, no prós e contras, e que Passos Coelho sugeriu já no Núcleo Duro do PSD;

10. Os governos de JS tiveram coisas muito boas, mas também geriram segundo um modelo de sustentabilidade completamente desadequado. Dizer que os governos JS foram óptimos é tão falso, errado e mentira como dizer que foram os piores da Democracia Portuguesa. O esforço de branqueamento é radical e por isso estéril;

11. A preocupação do PS em reescrever a história paralisa-o. Um partido como o PS paralisado pode ser o desastre que faltava para que a situação económica e social seja destruidora.