Sinais
A propósito do terceiro adiamento da entrega de propostas para a Auto-Estrada do Centro

Uma das questões que neste momento distingue o Governo do Partido Socialista da oposição, nomeadamente do PSD, é a defesa da promoção de grandes obras públicas, para incentivar o investimento privado com o objectivo de relançar a economia portuguesa. O Governo acha que, com o lançamento de projectos para a construção de linhas ferroviárias de alta velocidade, de barragens, de parques eólicos e de auto-estradas, as empresas vão aderir, vão criar empregos, e, consequentemente, gerar a circulação da riqueza, facto que fará reanimar a economia.
Esta é uma estratégia do Governo que, concorde-se ou não, foi sufragada pelo eleitorado – uma vez que o Partido Socialista não a escondeu – e que, por conseguinte, está legitimada. Os projectos têm sido lançados e os processos burocráticos estão a caminhar… como sempre.
O Partido Socialista, ao ganhar as eleições, acabou por dar sinais aos empresários, aos trabalhadores, a toda a população, de que estes investimentos iam ser feitos e isso, certamente, criou expectativas. Não podemos, então, deixar de nos sentir frustrados ao sabermos da notícia de que a empresa pública Estradas de Portugal adiou, pela terceira vez, o prazo para a entrega das propostas para a concessão da Auto-Estrada do Centro (que ligará Coimbra a Viseu, pelo norte do Buçaco, substituindo o actual IP3, e que normalizará o IC2 como via-rápida entre Coimbra e Águeda).
Em 29 de Março de 2008, na vila de Mortágua, foi o próprio primeiro-ministro a anunciar o lançamento do concurso para a concepção, construção, exploração e conservação da referida auto-estrada. Nesse dia, José Sócrates assumiu que a obra seria adjudicada ainda nesse ano de 2008 e que estaria concluída no ano 2011. Disse-o perante autarcas, perante pessoas, para a comunicação social, logo, para o país todo. A partir daí o Governo desdobrou-se em iniciativas nos diferentes municípios que beneficiariam directamente com a nova via de circulação, para divulgar a medida. O secretário de Estado das Obras Públicas, Paulo Campos, esteve na Mealhada a 10 de Abril desse mesmo ano e reafirmou o que havia dito o primeiro-ministro do outro lado do Buçaco, com a pequena nuance de prometer a conclusão da obra em 2012.
O concurso não foi lançado dentro dos prazos anunciados e em Agosto de 2009 é a própria Estradas de Portugal que decide anulá-lo – quando estava prestes a terminar – porque as propostas dos concorrentes ultrapassavam em 120 por cento o valor base previsto no inicio do concurso. Alguns autarcas ficaram muito revoltados, e com razão. O tema foi usado no debate político durante a campanha das eleições legislativas – especialmente entre Louçã e Sócrates –, mas, honestamente, é difícil demonstrar que a responsabilidade desta anulação seja, exclusivamente, do Governo.
Em 2 de Outubro de 2009, a Estradas de Portugal lança novo concurso. No anúncio deste segundo concurso, 16 de Novembro de 2009 é a data anunciada para apresentação das propostas. Entretanto, no início do mês de Novembro, a Estradas de Portugal adiou para 17 de Novembro e, depois, para 21 de Janeiro. Na manhã desse mesmo dia, e pela terceira vez, a empresa pública voltou a adiar o concurso, desta vez para 4 de Fevereiro.
Se as propostas forem aceites nesse dia, e não houver mais contra-tempos, a obra que Sócrates anunciou em Mortágua como estruturante e prioritária leva cerca de um ano e meio de atraso. E ainda não se passou da fase de concurso. Haverá atrasos, naturais, na adjudicação, e depois na construção e por aí fora… Na melhor das hipóteses a estrada que ligaria Coimbra a Viseu em 30 minutos, pelo norte do Buçaco, e que consolidaria a Mealhada como o grande centro rodoviário nacional, não estará pronta em 2012, mas em 2014 ou 2015.
Um atraso de, pelo menos, dois anos é o sinal que o Estado – Governo e empresas públicas – dá aos empresários, aos eventuais investidores, para os incentivar a investir? Este é o sinal dado pelo Estado para as obras que o Governo (este e os outros) classifica como prioritárias e estruturais? Muito se fala da obrigação de as autarquias fazerem um planeamento e ordenamento do território de modo sustentável. Que género de ordenamento se pode fazer com indefinições e adiamentos desta natureza?
Foram devidamente avaliadas as consequências de adiamentos deste género no caminho desse relançamento?
Ou será, apenas, o Tribunal de Contas uma força de bloqueio?

Editorial do Jornal da Mealhada de 27 de Janeiro de 2010