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A propósito do cineteatro da Pampilhosa
Será arbitrário o poder dos burocratas que nos governam?
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Temos vindo a acompanhar, com alguma apreensão, o desenrolar do processo de adjudicação da empreitada das obras de recuperação do cineteatro da Pampilhosa. Nos últimos meses tomámos conhecimento da falta de zelo e de consciência da parte da administração central em relação ao assunto — comportamento do qual, finalmente, damos eco na página três da presente edição. A administração central é responsável por um atraso de vinte e um meses na adjudicação de uma obra de recuperação de um imóvel público de elevado interesse e estima colectiva — propriedade de uma associação centenária e com grande tradição na promoção da cultura no concelho da Mealhada — que se encontra em elevado estado de degradação, numa localidade de elevada produção cultural, por iniciativa das suas associações.
Perguntarão os leitores por que razão não denunciou o Jornal da Mealhada uma situação de que tem conhecimento desde Julho de 2008. A resposta é simples: fomos sensíveis ao receio que nos foi manifesto de que alarido à volta deste assunto pudesse causar, em represália, um maior atraso do processo, com os consequentes prejuízos para a causa da recuperação do imóvel. Os interesses das associações do concelho da Mealhada, por principio, têm o Jornal da Mealhada como seu defensor militante. Pelo que, com a informação de que foi assinado, na sexta-feira, o contrato de adjudicação da obra, podemos agora, certos de que não disso não advêm estragos nem perigos, denunciar a situação e manifestar o nosso veemente repúdio.
Mal vai um país em que os seus cidadãos, com receio de represálias, se sentem inibidos de denunciar situações que resultam da falta de zelo da administração central. Mas a verdade é que Portugal é um país assim.
Mal vai um país em que um processo de adjudicação da recuperação de um edifício histórico, de utilização cultural, em degradação galopante, se arrasta por anos. Deste tempo, quinze meses foi o que a administração central levou a dar resposta à contestação do resultado de um concurso público, contestação que assentava na diferença de noventa euros entre os valores dos orçamentos apresentados pela empresa vencedora e pela empresa preterida. Para melhor esclarecimento veja-se a página três.
Mal vai um país em que as pessoas que voluntariamente dedicam o seu tempo a uma causa colectiva, como dirigentes de associações culturais ou desportivas, têm de resistir durante penoso período às dificuldades de um processo que é de utilidade para todos. O Estado, em vez de agradecer a estas pessoas tudo o que dão à sociedade, ainda as onera com o tempo que lhes faz perder em burocracias e com as despesas que se vêem obrigados a fazer para responder a exigências que podiam ser evitadas. Mais grave do que tudo isto, o Estado permite que, durante quinze meses, paire sobre estas pessoas a suspeita de terem tido falta de rigor ou interesses ocultos na escolha de uma empresa que, por sinal, foi a que apresentou orçamento mais elevado, mais noventa euros…
Não há Simplex nem medidas por decreto que consigam resolver um problema estrutural da Nação Portuguesa — a necessidade constante de para tudo ser preciso um papel, um formulário, requerimentos, declarações disto e daquilo, deslocações a repartições públicas que fazem perder dias de trabalho. É o sinal mais visível do estado de permanente domínio da burocracia em que o país vive e sob o qual é governado. No edifício administrativo do Estado Português, para além das pessoas que foram eleitas pelo povo para cumprir determinada missão ou responsabilidade, há muitas outras, talvez a maior parte, que alimentam, insistentemente, um sistema administrativo medíocre, terceiro-mundista, caracterizado pelo desleixo, pela irresponsabilidade, pela letargia em relação à solução dos problemas que têm em mãos.
Para além disto acresce o facto de tudo estar organizado não no sentido da resolução dos problemas dos cidadãos mas no sentido da tomada de posições arbitrárias. Problemas de natureza geológica, por exemplo, têm de ir a despacho a pessoas licenciadas em Direito. Há problemas de natureza ambiental que são decididos por gestores e economistas. Arbitrariedades que fazem perder dinheiro e paciência e suscitarão dúvidas quanto à qualidade da resolução dos problemas. Arbitrariedades que tornam hoje, como há dois mil anos, verdadeira a afirmação de que há um povo na Ibéria que não se governa nem deixa que o governem. Afirmação atribuída a Júlio César, cônsul de Roma.
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Temos vindo a acompanhar, com alguma apreensão, o desenrolar do processo de adjudicação da empreitada das obras de recuperação do cineteatro da Pampilhosa. Nos últimos meses tomámos conhecimento da falta de zelo e de consciência da parte da administração central em relação ao assunto — comportamento do qual, finalmente, damos eco na página três da presente edição. A administração central é responsável por um atraso de vinte e um meses na adjudicação de uma obra de recuperação de um imóvel público de elevado interesse e estima colectiva — propriedade de uma associação centenária e com grande tradição na promoção da cultura no concelho da Mealhada — que se encontra em elevado estado de degradação, numa localidade de elevada produção cultural, por iniciativa das suas associações.
Perguntarão os leitores por que razão não denunciou o Jornal da Mealhada uma situação de que tem conhecimento desde Julho de 2008. A resposta é simples: fomos sensíveis ao receio que nos foi manifesto de que alarido à volta deste assunto pudesse causar, em represália, um maior atraso do processo, com os consequentes prejuízos para a causa da recuperação do imóvel. Os interesses das associações do concelho da Mealhada, por principio, têm o Jornal da Mealhada como seu defensor militante. Pelo que, com a informação de que foi assinado, na sexta-feira, o contrato de adjudicação da obra, podemos agora, certos de que não disso não advêm estragos nem perigos, denunciar a situação e manifestar o nosso veemente repúdio.
Mal vai um país em que os seus cidadãos, com receio de represálias, se sentem inibidos de denunciar situações que resultam da falta de zelo da administração central. Mas a verdade é que Portugal é um país assim.
Mal vai um país em que um processo de adjudicação da recuperação de um edifício histórico, de utilização cultural, em degradação galopante, se arrasta por anos. Deste tempo, quinze meses foi o que a administração central levou a dar resposta à contestação do resultado de um concurso público, contestação que assentava na diferença de noventa euros entre os valores dos orçamentos apresentados pela empresa vencedora e pela empresa preterida. Para melhor esclarecimento veja-se a página três.
Mal vai um país em que as pessoas que voluntariamente dedicam o seu tempo a uma causa colectiva, como dirigentes de associações culturais ou desportivas, têm de resistir durante penoso período às dificuldades de um processo que é de utilidade para todos. O Estado, em vez de agradecer a estas pessoas tudo o que dão à sociedade, ainda as onera com o tempo que lhes faz perder em burocracias e com as despesas que se vêem obrigados a fazer para responder a exigências que podiam ser evitadas. Mais grave do que tudo isto, o Estado permite que, durante quinze meses, paire sobre estas pessoas a suspeita de terem tido falta de rigor ou interesses ocultos na escolha de uma empresa que, por sinal, foi a que apresentou orçamento mais elevado, mais noventa euros…
Não há Simplex nem medidas por decreto que consigam resolver um problema estrutural da Nação Portuguesa — a necessidade constante de para tudo ser preciso um papel, um formulário, requerimentos, declarações disto e daquilo, deslocações a repartições públicas que fazem perder dias de trabalho. É o sinal mais visível do estado de permanente domínio da burocracia em que o país vive e sob o qual é governado. No edifício administrativo do Estado Português, para além das pessoas que foram eleitas pelo povo para cumprir determinada missão ou responsabilidade, há muitas outras, talvez a maior parte, que alimentam, insistentemente, um sistema administrativo medíocre, terceiro-mundista, caracterizado pelo desleixo, pela irresponsabilidade, pela letargia em relação à solução dos problemas que têm em mãos.
Para além disto acresce o facto de tudo estar organizado não no sentido da resolução dos problemas dos cidadãos mas no sentido da tomada de posições arbitrárias. Problemas de natureza geológica, por exemplo, têm de ir a despacho a pessoas licenciadas em Direito. Há problemas de natureza ambiental que são decididos por gestores e economistas. Arbitrariedades que fazem perder dinheiro e paciência e suscitarão dúvidas quanto à qualidade da resolução dos problemas. Arbitrariedades que tornam hoje, como há dois mil anos, verdadeira a afirmação de que há um povo na Ibéria que não se governa nem deixa que o governem. Afirmação atribuída a Júlio César, cônsul de Roma.
Editorial do Jornal da Mealhada de 10 de Setembro de 2008