Como é tradicional, a Porto Editora anuncia no inicio de um novo ano a Palavra do Ano anterior. Confesso que, sabendo deste anúncio dei por mim a pensar que palavra escolheriam os portugueses.
Sensibiliza-me que a escolha tenha recaído sobre uma das mais simbólicas palavras da cultura portuguesa. Para os tempos em que lágrimas se choraram pela falta dos abraços, dos beijos e do toque, do calor, da carne e da ousadia, pela raiva ao medo, ao ar e ao suspiro, ganha especial importância o relevo dado ao sentimento, ao intimo, ao interior.
Todos temos saudades da Liberdade. Todos temos saudades da Festa. Todos temos saudades de não ter Medo. Mas só os portugueses serão capazes de o descrever com a palavra que inventámos para dizer o que somos por dentro. Neste dentro feito de viajantes e marinheiros, de pastores e de peregrinos, de fome e de miséria, de brio e de futuro, de galhardia e fanfarronice, de perda e de merda, de querer e não ter, de ter e distribuir, de ser e de crer ser mais.
Saudades, só portugueses

Saudades, só portugueses

Conseguem senti-las bem,

Porque têm essa palavra

Para dizer que as têm.

s.d.

Fernando Pessoa, Quadras ao Gosto Popular. (Texto estabelecido e prefaciado por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1965. (6ª ed., 1973).

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