17 de agosto de 2013
Francesc é catalão. Chegou aqui ao fim da tarde, já muito depois daquela hora a que normalmente chegam os peregrinos. É um homem de meia idade, e em vez da mochila, às costas, trazia uma especie de carrinho onde transporta a pouca bagagem que traz desde Sagres. Exactamente, desde Sagres, onde começou há catorze dias.
Diz que não sabe se chega a Santiago. Confessa – enquanto lhe passo as milhentas fotografias do cartão de memória para uma pendrive – que o objectivo passa primeiro por atravessar Portugal e depois por abraçar o apóstolo.
Para além da simbologia de Sagres – do extremo sul da Ibéria – Francesc assevera que quis seguir um roteiro de afectos. Não me explicou porque fez questão de ir a Miróbriga (Santiago do Cacém), nem a Conimbriga, mas emocionou-se ao referir-me que teria mesmo de ir a Grândola. Que toda a vida tinha sonhado ir a Grândola, a vila morena.
“Porque, infelizmente, morreram os dois na cama!” dizia-me Francesc, referindo-se à coincidência de António e Francisco – não lhes chamou Salazar e Franco – terem morrido de velhos, de velhice, passivos, na cama e não “na ponta de uma espingarda, à frente de um pelotão de fuzilamento”.
Falou-me como se Grândola fosse o sitio mais importante de Portugal – assim é para ele. E eu lembrei-me que não sei se alguma vez fui a Grândola. Porque para mim, o Grândola – a contrasenha – é a vila alentejana sem o ser… é o simbolo que se distancia do objecto que lhe dá corpo…
Não contei a Francesc que a primeira vez que José Afonso cantou “Grândola, vila morena” em público foi, exactamente, em Santiago de Compostela, em 10 de maio de 1972. Talvez valesse a pena acabar no Obradoiro o roteiro de afectos do catalão.