Entrevista ao JORNAL DA MEALHADA
Publicado em 23.01.2013

 
“A direção que lidero é muito jovem, mas foi educada para o Serviço”
 
Depois de no passado mês de dezembro ter sido eleito, Nuno Canilho prepara-se agora para um mandato de três anos como presidente da direção dos Bombeiros Voluntários da Mealhada. O Jornal da Mealhada falou com o dirigente sobre alguns dos temas mais relevantes desta associação humanitária.

Quais as
expectativas que tem para o seu mandato?

Antevejo um
mandato complexo, com a necessidade de um conjunto de tomadas de decisão
estruturantes para a associação e especialmente para o corpo de bombeiros. Mas
é essa complexidade que torna o desafio ainda mais aliciante e que nos deu
ânimo para nos candidatarmos à direção da maior e uma das mais antigas
colectividades do nosso concelho.

Tem noção
exata das dificuldades que a corporação tem?

Julgamos que
sim. Naturalmente, há um processo de aprendizagem que só o tempo e a acção
podem cumprir. Há dificuldades do foro económico-financeiro – apesar de termos
recebido a associação em óptima saúde financeira – naturais a uma colectividade
como esta, especialmente nos dias de hoje. Há dificuldades associadas à crise
social, com consequências e reflexos no voluntariado. Há necessidade de
investimentos que nos parecem importantes. Há a necessidade de apoiar o corpo
activo, investindo, ajudando na formação, apoiando, criando condições de cada
vez mais eficácia, prontidão e segurança. Há toda uma hiperactividade
legislativa, que faz com que em termos de determinação legal o que é verdade
hoje pode não se confirmar amanhã. E depois, há, também, o problema da
liberalização do sistema de transporte de doentes.

Quais são as
soluções para essas dificuldades?

A solução
passará por assumir a nossa missão com determinação e resistência. Os
investimentos e a questão financeira terão de ser resolvidos com o apoio da
comunidade, com o nosso esforço na angariação de fundos e com trabalho, as
questões sociais serão minimizadas com assistência e presença. Relativamente a
outras questões e lutas, temos de ser resistentes e defender intransigentemente
os interesses de uma associação humanitária que gere um corpo de bombeiros
activo e com operacionalidade. Os interesses desta associação são os interesses
da comunidade. Acreditamos que nessa defesa dos interesses coletivos, teremos,
sempre, ao nosso lado, as autarquias, as instituições, as empresas, as escolas,
as pessoas das nossas comunidades.

Está
preparado para todas as ocorrências que seja solicitado?

A missão de
uma direção de uma associação de bombeiros é estar na retaguarda, discreta,
garantindo que nada faltará aos nossos bombeiros e à população que servimos,
que os homens e as mulheres têm todas as condições para que possam cumprir a
sua missão da melhor forma possível: com tranquilidade, com eficiência, com
formação, com profissionalismo e, acima de tudo, em segurança.

No passado
sábado, 19 de janeiro, por exemplo, tivemos a nossa primeira prova de fogo, com
a necessidade de dar resposta, apoio e garantir condições logísticas ao nosso
corpo de bombeiros que estava no terreno a desempenhar um trabalho dificil, de
forma empenhada e inexcedível. Começámos com o pé direito, parece-nos que
estivemos à altura e isso anima-nos. A direção que lidero é muito jovem – das
mais jovens do país – mas é composta por um conjunto de pessoas que foi educada
para o Serviço e que vê neste compromisso uma responsabilidade de Missão e
Voluntariado. Somos todos tão voluntários como os nossos bombeiros e isso
ajudará a sermos cada vez mais eficazes na nossa ação.

Uma das questões que tem para resolver é a nomeação do comandante. Quando tenciona fazê-lo?

Desde
meados de dezembro e até porque a estrutura operacional de um corpo de
bombeiros é especialmente pragmática, o comando da corporação está a ser
assegurada pelo Segundo Comandante Joaquim Valente de Oliveira, que conta,
também, com o Adjunto de Comando Nuno Antunes João. Foi uma situação anterior à
nossa posse e que decorre do término do mandato do comandante António Lousada,
que exerceu a responsabilidade com elevado sentido de altruísmo e abnegação.

A
direcção está sensível à necessidade de nomear, a breve prazo, um comandante,
como lhe compete, e está a trabalhar nisso, afincadamente. Mas, no entanto,
queremos dar conta a todos de que estamos tranquilos e temos confiança absoluta
nas capacidades operacionais do comando em exercício. O passado fim-de-semana
foi exemplo brilhante da capacidade operacional do comando em exercício. Há
urgência na nomeação do comandante, até por uma questão de expectativas, mas
não há qualquer tipo de risco.

O material
da associação e a corporação são suficientes?

Pelas suas
características, o material de uma associação de bombeiros têm um desgaste
muito rápido. É sempre preciso substituir, arranjar, investir. De uma forma
geral, e genericamente, podemos assumir que ao nível da proteção individual dos
bombeiros, a situação é boa. No que diz respeito ao parque de viaturas, também
estamos muito bem equipados, será necessário, em 2013, investir na renovação
pontual de uma ambulância de socorro. Ao nível das infraestruturas, temos um
quartel que este ano assinala os 20 anos da sua inauguração e que precisará de
algumas beneficiações. Mas de uma forma global, em resumo, podemos dizer que
não temos razões de queixa.

Como está,
neste momento, a situação do transporte de doentes? É problemático?

Continua a
ser um problema. Foi minimizado pela questão de os taxis serem impedidos de
transportar alguns tipos de doentes, mas a liberalização do mercado de
transporte de doentes a empresas privadas está a levar algumas associações à
ruína, perante a completa apatia da administração central, que se arrisca a, nalguns
casos, deixar de ter quem apague os fogos e socorra os feridos. Na nossa
associação, houve, um período de completa asfixia e agonia, que a direção
anterior, liderada por Abílio Semedo, soube dirimir com sucesso. Mas não
podemos nem vamos baixar os braços, porque ainda há muito a fazer!

Interessava
que as pessoas percebessem que, em Portugal, a protecção civil de pessoas e
bens – que é uma obrigação soberana do Estado – é, na maior parte do
território, garantida por associações privadas, locais, com corpos de bombeiros
voluntários, e financiadas pelos sócios, a comunidade, e na maior parte dos
casos, apoios municipais. Ao longo do tempo, as associações socorreram-se da
prestação de outro tipo de serviços, pagos, que servem de financiamento das
associações. Nos últimos anos, no entanto, o Estado tem tido uma espécie de
surto legislador e, em vez de apoiar associações de pessoas que estão a cumprir
uma missão que devia ser sua, tem criado obstáculos ao funcionamento dessas
associações. Numa linguagem mais figurada, poderia dizer-se que o Estado está a
decepar a mão que cumpre uma missão em sua substituição.

A nova
legislação cria dificuldades?

O tal surto
legislador de que falei, por exemplo, veio criar um conjunto de exigências
formais aos voluntários – obrigando a volumes anuais de horas mínimas de
serviço operacional, por exemplo – que não se compreende. Toda a gente sabe que
há uma crise de voluntariado, muitos portugueses têm de trabalhar mais tempo
para auferir o mesmo rendimento, ficando sem tempo para dar a outras
actividades não remuneradas, mesmo assim, obriga-se a que um voluntário seja
impedido de dar o que pode, só porque alguém acha que não é suficiente.

O
financiamento dado à associação é sustentável?

As direções
que nos antecederam deram à Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da
Mealhada regras, condições e uma estrutura perfeitamente sustentável ao nível
económico-financeiro. A sustentabilidade é algo que se garante no dia-a-dia e
é, também para nós, um objectivo. O nível de financiamento da parte dos sócios,
com as quotizações, por exemplo, é muito bom, os apoios autárquicos são bons,
os serviços que prestamos, como já se disse, já foram mais rentáveis, mas
acreditamos que vamos minimizar as dificuldades.

Que novas
atividades tem previstas?

Amanhã, 24
de janeiro, quinta-feira, reunirá a assembleia-geral da associação. Peço a
todos os sócios que participem. Parece-nos que antecipar informações que
tencionamos ali divulgar poderia ser pouco cordial.

Qual o apelo
que gostaria de fazer às“gentes” da Mealhada?

Gostaria de
deixar dois apelos às nossas comunidades. Em primeiro lugar, queria pedir que
ajudem os bombeiros. Uma ajuda financeira – os que puderem -, mas também a
ajuda através de gestos de agradecimento, de alento, de apoio e apreço aos que
voluntariamente arriscam a vida pelos outros. Em segundo lugar, quero apelar
para que na declaração de IRS de cada cidadão, no campo 901 do quadro 9 do
Anexo H (Benefícios Fiscais e Deduções), coloquem uma cruz e o número de
contribuinte dos bombeiros da Mealhada (NIF 501 205 985). Dessa forma, sem
custos para o cidadão, a nossa associação receberá do Estado o equivalente a
0,5 por cento do valor pago em IRS pelo doador.

E às
entidades oficiais?

Às entidades
nacionais, apelo à sensibilidade e bom senso. Às nossas autarquias locais quero
dar garantias de confiança na operacionalidade e empenho do nosso corpo de
bombeiros e apelo a que continuem a ser solidárias e colaborantes como têm
sido.