“O Último Castelo”
A República Portuguesa em tempo de resgate viveu mais um dia em que pode “comprovar” a Lei de Murphy: “Se alguma coisa puder correr mal… certamente correrá mal!”. Não bastava o pulsar do Povo a gritar, a instabilidade na coligação governamental, as críticas de insensibilidade ao Chefe de Estado, a tensão nas autarquias locais, a certeza de um último feriado em cinco de outubro e alguma coisa tinha de correr mal… a bandeira da República foi hasteada ao contrário. Alguma coisa poderia correr pior? Se podia vai acontecer em breve…
A imagem do próprio Chefe do Estado, ao lado de alguém que se perfila para lhe suceder ou chefiar o Governo, a hastear a bandeira nacional de pernas para o ar, em dia de cerimónia do 102.º aniversário da implantação da República, perante o olhar distante dos portugueses na Praça do Municipio de Lisboa e em casa pela televisão, pode parecer, apenas uma caricatura… mas é mais do que isso… é uma terrível alegoria!
Em linguagem militar, uma bandeira hasteada de pernas para o ar é um sinal, é uma codificação para transmissão de uma mensagem muito precisa. Uma bandeira hasteada ao contrário significa que o território onde ela está foi tomado pelo inimigo. Ao hastear uma bandeira ao contrário, o transmissor pretende pedir ajuda a quem, ao longe, pode observar a bandeira. Trata-se de um pedido de socorro, naturalmente, que se verbaliza na consciência de que quem hasteia a sua bandeira nacional – o símbolo máximo da Pátria – de pernas para o ar está em terrível sofrimento.
No filme “O Último Castelo”, de 2001, com Robert Redford e James Gandolfini, de Rod Lurie, o gesto é dissecado e a sua explicação democratizada. Redford faz o papel de um coronel preso por insubordinação, mas que se mantém leal aos valores e à ética militar, consciente de que o que o levou à prisão foi resultado de uma opção de mal menor. Na prisão deve obedecer a alguém arrogante, incompetente e que maltrata e desrespeita os presos. A visão estratégica do preso leva-o a tomar a prisão, desmascarando o mau da fita, e morre agarrado à bandeira que deveria ter sido hasteada ao contrário, mas que não o foi, porque se “castelo estava tomado” pelo lado Bom da Força não valia a pena desrespeitar a bandeira.
Num país tão romântico como o nosso, a passada sexta-feira teria sido um dia simbólico para a ocorrência de um pronunciamento. A 5 de outubro assinala-se o dia da assinatura do Tratado de Zamora, entre o Rei Fundador e Afonso VII de leão e Castela. 5 de outubro de 1143 foi o dia da Fundação de Portugal, é o dia primeiro de quase nove séculos de história. Esta data seria merecedora de feriado nacional, em qualquer país do mundo… Em Portugal é feriado por causa de uma mudança de regime, qual elogio da justiça dos vencedores. Dizem que vai deixar de ser… por cinco anos… nos próximos dois calhará ao fim-de-semana e ninguém dele se lembraria… depois se verá. E quando voltar será o dia da República? Será o dia da Fundação? Será o dia em que o Chefe do Estado mostrou ao mundo que o país foi ocupado e está em sofrimento?
Cavaco poderá perguntar a si próprio: O que mais me poderá acontecer? Um dos seus assessores evitará dizê-lo, mas lembrar-se-á de Edward Murphy…
Editorial do Jornal da Mealhada de 10 de outubro de 2012