A situação politica nacional, neste momento, assemelha-se àquele jogo infantil da “bomba”. A bomba vai explodir, toda a gente sabe isso, e os jogadores, já em contagem decrescente, fazem passar a bomba de mão em mão, para que exploda em qualquer lado, menos entre os seus dedos. Perde quem tiver o azar de lhe explodir a bomba nas mãos.

Toda a gente sabe que o Governo vai cair e que vamos ter de ir para eleições antecipadas. Todos os líderes partidários e o Presidente da República querem ir para eleições o quanto antes. Acontece que nenhum quer ser acusado de ser o responsável pela marcação de eleições. Porque tal facto será relevante na dialética da campanha eleitoral, e principalmente, porque a queda do Governo trará consigo a entrada do FMI e do Fundo Europeu de Estabilização Financeira. Nem Sócrates nem Passos Coelho querem ser acusados de abrir a porta às medidas draconianas do Fundo Monetário Internacional.

Este jogo da “bomba” tem estratégias, como tem qualquer jogo. Interessa ter a “bomba” na mão nos momentos finais de modo a lançá-la a quem não tenha hipótese de se libertar dela. É mais ou menos isso que está a fazer o primeiro-ministro. Parece-me.

O PCP, o CDS e o Bloco não têm muito a perder com este jogo. São aqueles jogadores que têm a capacidade de começar a contagem – nomeadamente com a apresentação das moções de censura -, mas sabem que a bomba não rebentará nas suas mãos. Nenhum destes partidos tem capacidade para aprovar uma moção de censura, nem serão determinantes na votação de qualquer documento estratégico que obrigue à demissão do Governo.
O Bloco apresentou uma moção para se antecipar ao PCP, e não teve qualquer cuidado em redigir um texto que permitisse a adesão do CDS ou do PSD.
O PCP pode vir a ser o censor que se segue, e também não deve dar-se ao trabalho de fazer com que o texto possa ser aprovado pela direita.
O Bloco e o PCP serão os partidos que menos interesse têm em eleições. O primeiro porque teve um resultado extraordinário em 2009, e dificilmente aumentará o número de deputados – até porque os problemas internos estão a agudizar-se no Consórcio das Esquerdas. E o PCP há anos que cada vez que vai a votos perde deputados e isso não lhe interessa nada.
O CDS, no entanto, não apresentará uma moção que não tenha o apoio implicito do PSD. No próximo fim-de-semana o partido de Portas reúne em Congresso, e cheira-me que para marcar a agenda politica, anuncie a apresentação de uma moção de censura.

Pedro Passos Coelho está a ser pressionado para fazer cair o Governo. Passadas as eleições presidenciais, e eleito Cavaco, não há o medo de o PSD contribuir para a não reeleição do presidente, e os barões estão ansiosos por ir a votos e voltar ao poder. O líder não quer o poder a qualquer preço, quando ainda não conseguiu munir-se de todas as ferramentas – pessoas e estratégias – para ser primeiro-ministro com tranquilidade. Acontece que o PSD é um partido que não aguenta a ausência de poder durante muito tempo, e essa turbulência política está a mexer com os social-democratas. Se não houver eleições dentro de poucos meses, as vozes vão começar a pedir a cabeça de Coelho… e Rio está à espreita! Até porque a manutenção do PS no Governo só se faz se este tiver o apoio do PSD.
O líder da oposição recebeu a bomba com o anuncio do PEC4, devolveu a bomba a Sócrates no sábado, e o PS voltou a devolver-lha com a declaração de Sócrates a dramatizar. Passos hoje manda a bomba para Cavaco, que por sua vez a mandou para o PS, que hoje já diz que o PEC4 é negociável se o PSD quiser… e se não quiser perde o jogo. E a bomba está, de novo, nas mãos de Coelho.

José Sócrates armou uma ratoeira ao PSD com este PEC4. Anunciou as medidas de austeridade no dia em que tinha de as levar a Bruxelas, tendo-as mantido escondidas no debate da moção de censura do BE. O primeiro-ministro sabia que o PSD não está em condições de chumbar a substância das medidas, porque, aparentemente, elas são necessárias e porque foram impostas por Bruxelas. Mas Sócrates sabia que o PSD não podia aceitar a forma como as medidas foram tomadas – sem aprovação no Conselho de Ministros, às escondidas, sem informação ao Presidente, sem informação à concertação social e, acima de tudo, sem negociação prévia com a oposição. Ou seja, para que eles não possam aprovar estas medidas – e lhes exploda a bomba na mão – temos de viciar a forma. E foi isso que Sócrates fez. Fez o pior possível, para ter a certeza de que o PSD não aprove estas medidas.

Pode perguntar-se: Mas que interesse tem Sócrates em sair do poder, neste momento? A resposta é simples, Sócrates, de facto, não está agarrado ao poder, mas percebeu que está num pântano, que já não pode fazer muito mais pela confiança dos mercados e dos portugueses, que não consegue remodelar o Governo, que tem ministros exaustos a pedir para sair por Amor de Deus – como o Amado. Sócrates tem o partido a minar a sua liderança e já percebeu que tem de sair. Não acredito que esteja a promover uma politica da terra queimada, até porque quer regressar, mas quer ver-se livre deste problema o quanto antes.

Resta Cavaco. O presidente não quer ser o agente da queda do Governo. Vai fazer o tudo por tudo para que o Governo caia no Parlamento, mas a coisa não está fácil. Cavaco não quer ser acusado de estar a favorecer a Direita, e sabe que tem a Esquerda à perna – uma esquerda que se recusa a aplaudir um discurso de um Chefe de Estado eleito por 53 por cento dos portugueses votantes.
Cavaco tem a perfeita noção de que a queda do Governo será o caos económico, que ele sabe ser inevitável, mas não quer ser ele a ter a bomba na mão quando rebentar.

Os tempos não são nada fáceis! E a contagem continua… e continuará

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