Notas presidenciais 2011_7

Eleições para quê?
No rescaldo

Não há muito a dizer relativamente às eleições do passado domingo, que reelegeram Cavaco Silva para o seu segundo mandato como Presidente da República. Duas horas e meia depois de terem fechado as urnas no arquipélago dos Açores, já se conhecia o vencedor, já estavam apuradas quase todas as freguesias – faltando apenas as que boicotaram o acto eleitoral –, já tinham discursado os derrotados, os vencedores, e os principais líderes partidários. Uma noite sem história, portanto.
Ficou uma vez mais provado que os portugueses não arriscam na escolha de quem os governa, mesmo que a análise global de avaliação do sistema político não seja nada positiva. Como sublinharam vários comentadores na noite eleitoral (não sabemos se pode chamar-se noite a pouco mais de duas horas de apuramento de resultados), com a exceção da primeira eleição de José Sócrates, que derrotou Pedro Santana Lopes – que não havia sido eleito, mas nomeado –, nunca os portugueses deixaram de reeleger um primeiro-ministro ou um presidente da República que se recandidatasse.
Mas como dissemos no Editorial da semana passada, no domingo, 23 de janeiro, realizou-se “um teste à Democracia portuguesa”. Como referimos, antes de conhecer os resultados eleitorais: “Será inevitável um debate profundo e uma reflexão aturada se, num ambiente de crise política como a que vivemos, a abstenção atingir valores que superem os cinquenta por cento”. Assim aconteceu. Mais de 53 por cento dos eleitores preferiram não votar – na Mealhada foram mais de 55 por cento – cerca de dois e meio por cento a mais do que nas eleições de 2001, que reelegeram Jorge Sampaio.
Acontece que em 2001, era muito significativa a abstenção técnica – nomes de pessoas falecidas nos cadernos eleitorais que contavam como eleitores e inflacionavam a abstenção. Com a actualização dos cadernos, o número de eleitores aproximou-se mais da realidade, o que nos faz acreditar que o aumento do número de abstencionistas não foi de apenas dois e meio por cento, mas de duas ou três vezes mais.
No número de pessoas que não votaram parece existir um valor significativo dos que não o fizeram porque, por causa do cartão do cidadão, não o puderam fazer.
De qualquer modo, sendo impossível determinar a razão pela qual não votam mais de metade dos portugueses em condições para o fazer – haverá razões de muita natureza –, dúvidas não existirão acerca dos que foram votar e deixaram os seus votos em branco, ou os anularam. Essas pessoas, definitivamente, demonstraram uma clara objeção ao sistema político português – seja na sua organização, seja relativamente aos resultados da ação dos seus protagonistas, seja porque não se revêm em nenhum dos candidatos que se apresentaram. Quase trezentas mil pessoas – cerca de seis por cento dos que efetivamente votaram – mostraram esse seu descontentamento, no passado domingo.
Um descontentamento que não pode ser ignorado – como referimos há uma semana. “E isso é grave. É muito grave. Porque alguma coisa vai ter de mudar. Porque a Democracia não pode ignorar o que é a expressão da maioria”, repetimos.

Editorial do Jornal da Mealhada de 26 de janeiro de 2011
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