Eleições para quê?
No próximo domingo, 23 de janeiro, realiza-se a primeira volta das eleições que escolherão o Presidente da República Portuguesa, o Chefe de Estado. Antevê-se – pelo que se pode apurar dos estudos de opinião – um ato eleitoral pouco participado, apesar de todas as candidaturas garantirem um aumento progressivo da base de apoiantes.
Não deixa de ser curioso – se tal facto se vier a verificar – que no meio de uma crise tão grave como a que hoje vivemos, que já alastrou para uma crise financeira, económica e social – com o aumento inquietante da criminalidade violenta, por exemplo –, os portugueses demonstrem claramente que não é através de eleições que os problemas do país se resolvem.
É certo que a maturidade politica deste Portugal do século XXI – que muitos gostam de menorizar – já permite reconhecer que não é o Chefe de Estado que governa, apesar de poder determinar o rumo da governação. Mas também se reconhece que o Presidente da República não é um ‘verbo de encher’ e que a sua ação é determinante no passado – com todas as ações, omissões ou cumplicidades –, no presente e no futuro do País.
O que não deixa de ser extraordinário é que, mesmo assim, os portugueses considerem que não é no poder político que reside a solução para a resolução dos seus problemas. E isso é, de facto, dramático.
Em 1991, na eleição que reelegeu Mário Soares para o segundo mandato presidencial, a abstenção foi de 37,84 por cento. Em 1996, na eleição de Jorge Sampaio, a abstenção desceu e cifrou-se nos 33,71 por cento. Em contrapartida, em 2001, na reeleição de Sampaio, mais de metade dos eleitores preferiram ficar em casa e não votar: 50,29 por cento. Nas últimas eleições presidenciais, 38,47 dos eleitores não votaram. Ou seja, nos actos eleitorais em que todos os candidatos se apresentam pela primeira vez, a abstenção é menor do que nas eleições onde há recandidatura. Está desenhada a tendência para o que poderá esperar do próximo ato eleitoral.
No próximo domingo realiza-se mais um teste à Democracia portuguesa. Não queremos com isto dizer que a escolha do candidato A ou B coloca em causa o normal funcionamento das instituições. Seja quem for o eleito, comprometer-se-á em cumprir a Constituição e fá-lo-á com zelo e honestidade. O que consideramos é que será inevitável um debate profundo e uma reflexão aturada se, num ambiente de crise política como a que vivemos, a abstenção atingir valores que superem os cinquenta por cento. Se na noite de 23 de janeiro chegarmos à conclusão de que mais de metade dos portugueses preferiram não votar, então será inevitável a conclusão de que a maior parte dos portugueses não se revê neste sistema político.
E isso é grave. É muito grave. Porque alguma coisa vai ter de mudar. Porque a Democracia não pode ignorar o que é a expressão da maioria.
Editorial do Jornal da Mealhada de 19 de janeiro de 2011