As crianças são poderosas ‘esponjas’ que absorvem tudo o que passa à sua volta – sejam palavras, acções, gestos, omissões. Fazem-no de tal forma que quando nos apercebemos do que ‘lhes’ mostrámos, temos (tantas vezes) razões para nos arrependermos.
*
* ** *
Este fim-de-semana fui ‘acampar’ com os meus exploradores. Não foi um acampamento, foi um acantonamento, mas o principio activo é o mesmo: Fomos em actividade de escuteiros, clássica!
Como em todas as actividades escutistas clássicas, na última noite, fazemos o Fogo Conselho, um espaço destinado a dar aos jovens asas na criatividade e na expressão artística, especialmente na música, na expressão dramática, por aí.
As Raposas – a patrulha Raposa só tem raparigas – apresentaram dois momentos teatrais (um sério e um cómico) inspirados nos Ídolos, o programa de televisão da SIC. Apresentaram duas peças com piada e com uma mensagem fácil de percepcionar. Não muito elaborada, mas reveladora.
Já os Lobos – a patrulha Lobo é a mais heterogénea – representaram um primeiro momento, banal, que disseram ser cómico, e depois, um segundo, que disseram ser sério, verdadeiramente desconcertante. Eu pelo menos dei por mim absorto com o que estava a ver.
O tema da Aventura anual é o ‘Astérix’. Então a peça séria dos Lobos passava-se na aldeia gaulesa do Astérix. O personagem principal é um jovem que tem uma característica: É muito mentiroso. Para se safar das responsabilidades, das tarefas e das culpas, inventa sempre elaboradas mentiras que, quase todas, acabam por tramar a irmã mais nova. Irmã essa que acaba por ser uma vítima nas mãos do protagonista, ora porque é castigada pela mãe que acredita sempre no irmão, ou pelos professores que aceitam as mentiras em que ela acaba por ser sempre a culpada de tudo o que acontece ao irmão, etc. etc. etc. Chega a ser agredida pelo próprio protagonista quando esta ameaça que o vai desmascarar.
O protagonista cedo se apercebe que se as mentiritas que prega à mãe, aos vizinhos e professores ‘colam’, não haverá mal em avançar nessa escalada… O tempo passa e o protagonista torna-se um salteador, enriquece com o proveito dos roubos e safa-se sempre.
Portador da informação de que é avultada a maquia que se encontra nos cofres públicos da aldeia, com o dinheiro que roubou, ele acaba por ter condições para apresentar uma candidatura a chefe da aldeia dos gauleses. Candidata-se e ganha.
Consegue roubar o dinheiro todo dos cofres, deixando a aldeia na miséria, e no dia seguinte à tomada de posse foge. Nesse mesmo dia, a aldeia é invadida pelo exército romano, e acaba a aldeia dos gauleses irredutíveis.
+
A história tem moral? Tem! É reveladora de um código de valores valorizado? É!
+
Pois… mas sabem que nome é que tinha o protagonista?
Sócratix, precisamente!
+
Procurei fazer um pouco de pedagogia junto dos miudos, fazendo-lhes perceber que se tratava do primeiro-ministro, uma pessoa que ocupa uma determinada responsabilidade e que teria de ser respeitada por isso. Que não deveríamos classificá-lo assim, como um mentiroso que se deu bem, só porque não concordamos com algumas das medidas que empreendeu.
E quem nem tudo o que ouvimos na televisão justifica que insultemos as pessoas – mesmos as que não conhecemos – desta maneira.
Dei por mim a fazer de advogado do Diabo – bastar-me-ia estar calado, fingir que não percebi, elogiar a criatividade… Mas chocou-me a forma como, hoje, informações depreciativas dos protagonistas, como a própria informação chega aos ouvidos dos nossos jovens.
Note-se que os meus exploradores têm entre 10 e 12 anos!
+
Temos que pensar muito nisto!
* Que Deus me proteja de mim mesmo.
[EST. 21.12.10, às 00h20m]
__________________