«Cada geração precisa de uma nova revolução»
Carlos Jalali, docente da secção autónoma de Ciências Sociais, Jurídicas e Políticas da Universidade de Aveiro, escreveu, recentemente, um artigo, intitulado “Os Cidadãos e a Politica em Portugal: um divórcio por mutuo consentimento?” – acessível em http://uaonline.ua.pt/detail.asp?lg=pt&c=17980 – que, para além de ser muito interessante ajudará a compreender o fenómeno social do desinteresse pela Política, que a todos deve preocupar, pese embora o autor defenda que serão os políticos os menos interessados em voltar a juntar eleitos e eleitores.
Olhar com pessimismo para o futuro da democracia não é coisa recente. Jalali lembra comentários do antigo chanceler alemão Willy Brandt, um dos pais da União Europeia, em meados da década de setenta do século passado para ilustrar esta ideia. O docente da Universidade de Aveiro considera, até, que o 25 de Abril de 1974, em Portugal, terá contribuído para contrariar as perspectivas dos que comungavam do pessimismo de Brandt. Carlos Jalali cita Samuel Huntington para sugerir que “a revolução portuguesa assinalou também o início da chamada «terceira vaga de democratização» – um período da história do planeta em que a democracia tem progredido significativamente”.
Esta terceira vaga de democratização terá permitido que nos últimos trinta e cinco anos o número de democracias tenha triplicado e que o “debate tenha deixado de ser sobre os méritos da democracia liberal (em oposição a outros regimes) para se centrar na qualidade da democracia”.
Esta qualidade da democracia, num modelo de Diamond e Morlino, já neste século, ocorrerá segundo uma avaliação em três níveis distintos: “o dos procedimentos democráticos (que reflectem inter alia a competição eleitoral, o enquadramento legal e o accountability vertical e horizontal dentro do sistema político); o conteúdo da democracia (i.e., se garante efectivamente a liberdade e igualdade – política, social e civil – dos seus cidadãos); e os seus resultados – a avaliação que os cidadãos fazem do seu funcionamento, e se esta se mostra capaz de formular e executar políticas públicas que reconheçam e satisfaçam as exigências dos cidadãos e do interesse público”.
A verdade é que ao nível dos resultados, a avaliação da qualidade das democracias, e especialmente da portuguesa, parece não ser muito positiva. O politólogo Pedro Magalhães, também citado por Jalali, fala-nos, novamente em três D da actualidade. Se em Abril de 1974 queríamos Descolonizar, Democratizar e Desenvolver, hoje os portugueses serão Democratas, é certo, mas Descontentes com o desempenho das instituições políticas e Desafectos – um sentimento algures entre o Desinteresse e o Distanciado.
Jalali remata o seu texto com uma ideia de certo modo inquietante: “O distanciamento entre cidadãos e a política não é necessariamente negativo para governantes – pelo menos a curto prazo. Como refere Martin Wattenberg (2000), obter mandatos com menos votos ‘é o equivalente da General Motors obter os mesmos lucros com menos carros vendidos’”. E lança a questão: “Como então ultrapassar os desafios contemporâneos da democracia?”. “Tal como em 1974, a resposta talvez resida numa revolução – embora desta feita uma «revolução» sem armas, que se baseie antes na participação política dos cidadãos, na transparência de governantes e na dimensão ética de uns e de outros. Afi nal, como Thomas Jefferson afirmou um dia, ‘Cada geração precisa de uma nova revolução’”, rematou. E nós aplaudimos.
Editorial do Jornal da Mealhada de 7 de Julho de 2010