O rescaldo eleitoral
Já se disputou o primeiro combate nacional do ciclo eleitoral de 2009. Quem acompanhou o resultado dos apuramentos, os comentários políticos e as leituras de carácter mais ou menos profético chegou à conclusão do costume: “Todos ganharam” menos o partido do Governo. O PSD teve mais votos e mais mandatos do que o PS e do que tinha tido em 2004, logo, ganhou. O Bloco de Esquerda duplicou o número de votos e triplicou o número de mandatos, logo, ganhou. A CDU manteve o número de mandatos mas, apesar de ter sido ultrapassada pelo Bloco por uma unha negra, obteve mais votos que há cinco anos, logo, ganhou. O CDS manteve o número de deputados que tinha conquistado em 2004 — quando concorreu coligado com o PSD — mas ganhou às sondagens que o remetiam para um resultado insignificante. Até os votos em branco ganharam nestas eleições — se fossem um partido seriam a sexta força e até poderiam ter elegido um deputado. Não seria interessante haver no Parlamento uma cadeira vazia em nome destes votos? Em resumo, todos ganharam menos o PS.
De facto, o Partido Socialista não ganhou. Não há maneira de, à boa maneira partidocrática portuguesa, conseguir achar uma vitória nesta derrota. O PS perdeu mais de meio milhão de votos relativamente a 2004. O PS tem hoje um número de mandatos que só se pode comparar ao resultado obtido na eleição de 1987. Os socialistas perderam nada mais nada menos do que cinco mandatos — Portugal perdeu dois deputados europeus e acreditamos que possam ter sido retirados um ao PS e outro ao PSD.
Os portugueses quiseram penalizar o Governo pela acção política? Provavelmente essa será a razão mais plausível para justificar o resultado. Poderá dizer-se que, depois desta noite eleitoral, é garantida uma derrota do PS nos combates seguintes e, especialmente, no combate das eleições legislativas? Não nos parece. Em primeiro lugar porque os portugueses atingiram já um estado de maturidade democrática que lhes permite distinguir o que é a valer e o que é a feijões. Em segundo lugar porque neste combate os protagonistas não eram Ferreira Leite e Sócrates, eram outras pessoas para outros lugares. Mas há um dado essencial que agora se revela e que pode importar. Trata-se de um elemento subjectivo muito relevante: A invencibilidade de Sócrates não é irreversível. Ou seja, é possível Manuela Ferreira Leite travar o combate de igual para igual com Sócrates. Isso é importante porque vai aumentar a intensidade da campanha tanto do lado do PS como do lado do PSD e vai aumentar o apelo ao voto útil. Dito de outra forma: O primeiro combate traz maior interesse aos seguintes.
Foi anunciada como a maior inimiga deste acto eleitoral. Falamos da abstenção. A declaração não passou disso mesmo e nenhuma das candidaturas fez fosse o que fosse para a combater. No entanto, a abstenção não aumentou. Pode dizer-se que a percentagem de abstenção aumentou. E é verdade. Mas acontece que Portugal viu aplicada uma lei do recenseamento obrigatório e automático que fez insuflar o número de eleitores inscritos involuntariamente. A verdade é que em 2009 votaram mais 150 mil pessoas do que em 2004. Não há, no entanto, qualquer motivo de alegria. Nem achamos — como afirmámos na passada edição — que da abstenção se possam fazer leituras politicas de desagrado ou descontentamento.
A conclusão a tirar é que Portugal está cada vez mais europeu! O nível da abstenção em Portugal esteve abaixo do nível verificado em muitas das democracias mais consolidadas da Europa. O Reino Unido, a Holanda e a Suécia, por exemplo, tiveram abstenções superiores à portuguesa. A abstenção em França, na Alemanha e na Finlândia não foi muito inferior à portuguesa. E já para não falar na abstenção nos países que recentemente entraram na União.
A situação da abstenção pode ser, aliás, muito mais grave do que seria de esperar. Não é um problema exclusivo dos portugueses, é um problema de todos os cidadãos dos estados-membros que demonstram estar, cada vez mais desinteressados da união política que é hoje a Europa.
Editorial do JM 745 e do FRONTAL 1 de 10 de Junho de 2009
quem não vai votar não tem razão para lamentar